Ele tem mais de cem anos.Pertencera à minha bisavó, depois à minha avó paterna,ficando finalmente aos cuidados de minha mãe.
Velho caldeirão de ferro que tantas vezes confidenciou-me seus segredos de feijão ou pinhão cozidos.
Aquela cozinha de assoalho de tábuas largas, o fogão a lenha num dos cantos, próximo à janela que sondava quintais ,a ponte sobre as águas claras do rio das Antas e a estradinha de chão que levava a olaria,nao sem antes cruzar as terras dos Rodrigues da Anunciação e os caquizeiros de dona Percilia.
Era nele que vó Maria fazia o mais delicioso feijãozinho que já comi.
Toucinho defumado,alho,louro e pimentão vermelho ainda habitam os recônditos de meus paladares.
Chegava o inverno e era nele que fervilhavam os pinhões catados nas desfalhadas de pinhas nos incontáveis pinheiros que erguiam- se em taças pelos potreiros a brindar dias de imensa serenidade.
Cuido dele com carinho.Dei-lhe um trato com pincel e tintas e o adornei com rosas,destacando-se as brancas que sempre foram as preferidas de Nhá Teixeira.
Está em meu estabelecimento e confesso que já recebi algumas ofertas tentadoras por ele.
Recusei e continuarei recusando a todas.
Vende-lo seria desfazer-me de parte da minha história de vida que, embora humilde e modesta, fez a aurora de sóis dos meus melhores dias.
Enquanto escrevia estas memórias,retomei a fala de vovó:
"Este piá nåo presta, mas a gente gosta do danado".
PS.
Para completar esta minha sessão nostalgia,um galo ,pela vizinhança,rasga agora no bico uma cantiga dolente que combina com a cinzenta e fria tarde desta quarta feira.